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Em meio a pressa das multidões no Centro de Fortaleza, hábitos que pareciam ter ficado no século passado se perpetuam na Praça do Ferreira

Alessandra Castro e Lia Rodrigues

Terça-feira, 10 horas da manhã. Centenas de pessoas circulam pela Praça do Ferreira, Centro de Fortaleza, cada uma com um objetivo diferente: umas vão trabalhar, outras vão às compras, algumas vendem algum produto e outras, simplesmente, sentam nos bancos, a fim de bater um papo com os amigos ou mesmo ver o movimento e o tempo passar.

 

Localizada entre as ruas Floriano Peixoto, Major Facundo e Travessa Pará, a Praça do Ferreira é reduto de gerações mais antigas. É comum ver, nos bancos da praça, senhores e senhoras, aposentados ou não, que cultivam o hábito de ir ao Centro da Cidade para passear, encontrar os amigos e relembrar os velhos tempos. Importante ressaltar que os frequentadores são diversificados, sem distinção de cor, raça, idade ou classe social.

Encontro entre amigos

Próximo à esquina da rua Floriano Peixoto com Travessa do Pará, em frente a uma das muitas bancas de revistas e jornais do local, avista-se um grupo de amigos sentados em roda, conversando animados em meio a muitas gargalhadas.

A Banca O Paixão é ponto de encontro de antigos amigos, principalmente aqueles naturais do município de Baturité, terra natal do proprietário que dá nome ao estabelecimento. Alguns são aposentados, outros não, mas uma coisa é unanimidade: a vinda certa à Praça — que para alguns é diária e, para outros, duas ou três vezes na semana.  

Presença frequente na praça, o aposentado Carlos Viana, 74, sai, de segunda à sexta-feira de sua casa no bairro de Fátima, para ir à Banca. O local faz parte de sua rotina há pelo menos dez anos. “O que me faz vir à praça é isso aqui: o papo e os amigos. É atrás disso que venho para cá. Se eu ficar em casa, o que é que eu vou fazer? Olhar para a televisão, que não tem nada que preste? Quando tem um feriado, fico doidinho dentro de casa, sem saber o que fazer”, explica Viana.

 

Nos dias em que vai ao local, chega por volta das 8 horas da manhã e fica até às 14 horas. Um dos baturiteenses que frequentam a banca, o aposentado afirma que o local é o “consulado de Baturité” em Fortaleza. “É um hábito que trouxemos do interior para cá, de se reunir na pracinha, conversar, mentir [risos]. Continuamos a fazer isso aqui”, afirma.

Carlos Viana frequenta a Praça do Ferreira há dez anos

Deuzimar Bezerra vai à Praça do Ferreira no intervalo de trabalho

Entre um intervalo e outro do horário de trabalho, Deuzimar Bezerra, advogado de 62 anos, tem sempre um tempinho livre para ir até a Banca O Paixão para encontrar os amigos e jogar conversa fora. “Eu venho aqui todos os dias. Passo um pedacinho, converso sobre política, futebol, o dia a dia da Praça, os comentários… A conversa aqui é bastante eclética. De tudo tem um pouco”, ressalta.

 

Frequentador do Centro há 40 anos, no entanto, ele diz, com um pouco de melancolia, que a insegurança na Cidade fez com que diminuísse as andanças no local. “Aqui tem gente de todo tipo, ninguém sabe mais quem é quem. Aqui e acolá têm umas confusões. Antigamente não era assim”, lembra. Os amigos, para ele, são o principal elo com o Praça. “Os amigos são o que continua me trazendo aqui. Até para gente ir ao cinema, mais a noitinha, a gente não se sente seguro como antigamente”, conta.

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Anfitrião

Dono da banca desde 1963, Francisco Paixão, de 70 anos, conta um pouco das mudanças que viu a Praça do Ferreira passar. “Eu cheguei aqui com 15 anos, trabalhei com o Bodinho. Aqui não era assim, não. 'Zé Walter', quando foi eleito, que reformou a Praça. Ele disse que, se fosse eleito, iria reformar a Praça, e realmente reformou”, lembra.

 

Paixão é hospitaleiro com todos. Aos amigos que vão chegando, ele oferece de pronto uma cadeira para sentar. O cafezinho quentinho é ofertado logo em seguida, junto com o pão de queijo. A receptividade se repete também com os desconhecidos que chegam puxando conversa.

 

“Eu adoro esse movimento. Tem um cafezinho, não quer, não? Tem uma água, tem um pãozinho de queijo, não quer, não? Tem cadeira pra sentar. Quando chove, a gente acolhe dentro da banca. A minha vida é essa aqui”, fala Paixão com felicidade.

 

Ele ainda ressalta que, na Banca O Paixão, é proibido confusão. “Aqui virou ponto de encontro porque reúne amigos, torcedor do Ceará, Fortaleza, Ferroviário. Aqui não tem negócio de confusão, não”.

 

É no movimento incessante do Centro que hábitos antigos vão permeando e amizades vão surgindo. Em meio aos passos agitados dos transeuntes, os que chegam a banca, logo se cumprimentam. Os que vão, se despedem querendo ficar.

Antigos hábitos

O jornalista Pedro Gomes de Matos Neto, 69, também é frequentador do Centro da Cidade, desde que tinha por volta de dois anos de idade e ia ao local com seu pai. Engraxar os sapatos com os engraxates da Praça do Ferreira e comer um tradicional pastel acompanhado de caldo de cana na Pastelaria Leão do Sul são algumas das coisas que ainda levam o jornalista, natural de Maranguape e morador da Praia de Iracema, ao local.

 

“Quando era pequeno, meu pai vinha de Maranguape com os oito filhos para passear na Praça do Ferreira, assistir a peças no Theatro José de Alencar. Meu avô também frequentava a Praça. Hoje, venho pelo menos duas vezes ao mês”, explica.

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